quarta-feira, 7 de abril de 2010

Sobre "Ter o bolo e comê-lo"

Nogueira Leite, a propósito da remuneração do Presidente da EDP, veio em sua defesa falando de um contrato livremente aceite entre as partes, em regras de mercado e associando a crítica à inveja e mediocridade.

Porque critiquei aqui os valores auferidos pelo Presidente da EDP e porque não me considero invejoso (deixo a questão da mediocridade para a avaliação de outros), decidi escrever um pouco mais sobre o assunto.

O primeiro comentário que gostaria de fazer é que, longe de mim pensar em quebras contratuais. O facto de criticar um contrato não pressupõe que admita quebrá-lo.

O Estado também não deveria permitir qualquer incumprimento contratual. Aquilo que julgo deveria fazer, antes, era aproveitar a extraordinária generosidade revelada no caso pela EDP (generosidade tanto maior quanto se imagina ser a mesma extensível aos demais trabalhadores, até porque fruto de extraordinários resultados da empresa), para evidenciar junto da entidade reguladora do sector o manifesto desequilíbrio existente entre os interesses daquela e o dos seus consumidores. Estou certo que o regulador, sobretudo em momentos difíceis como os que atravessamos, vendo tamanha fartura de um dos lados da equação, não deixaria, naturalmente, de ser levado a rever fortemente em baixa a política de preços praticada pela EDP, fazendo com isso estender a generosidade desta, também, aos seus consumidores.

Estou certo que se o regulador retirar as necessárias consequências de tamanha fartura por parte da EDP a graça não se repete novamente, ou, se se quiser, o mercado em matéria de remunerações passa a funcionar de outra forma.

Um segundo comentário prende-se com a inveja. É verdade que, causa ou consequência de sermos um país pobre, somos um país onde a inveja pelo o que os que mais têm campeia. Mas essa inveja resulta, também, de sermos um país que distribui muito injustamente os seus recursos e onde a falta de regras e de exemplo levam a que todos desconfiem de todos, nomeadamente do mérito.

Termino dizendo que considero que as pessoas devem receber em função do seu mérito e dos seus resultados, mas que creio que alguns valores remuneratórios que têm vindo a ser falados, mormente em algumas empresas monopolistas, ou quase monopolistas, ultrapassam, sob qualquer perspectiva, a medida do razoável. Não sei quais serão os valores razoáveis mas sei, ainda que intuitivamente, quando estamos perante valores totalmente inadequados.

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