sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Regionalização?

Ontem à noite tive oportunidade de assistir a mais uma conferência inserida na louvável iniciativa da Câmara Municipal do Porto: um ciclo de debates sob o título “Regionalização: que vantagens para Portugal?” Moderados pelo Presidente da Câmara, os intervenientes eram todos eles de provado gabarito intelectual e político: António Costa, Marcelo Rebelo de Sousa e Paulo Rangel.
O “sub-tema” abordado foi o de qual o papel a desempenhar pelos municípios e freguesias num quadro de regionalização.
Considero que os três intervenientes – cada um ao seu estilo – fizeram boas intervenções.
António Costa, mais directo, deixou transparecer a sua experiência enquanto presidente da C.M.de Lisboa e algumas das suas preocupações (nomeadamente a inadequada (sub)dimensão de alguma das duas cinquenta e pouco freguesias –algumas delas com cerca de 800 habitantes, outras com 40.000…, a perda 200.000 habitantes do concelho de Lisboa nos últimos 20 anos, etc).
Marcelo Rebelo de Sousa, como o próprio avisou no início da sua intervenção, acabou por fugir ao tema o que apenas a tornou muito mais interessante! Optou por fazer uma resenha histórica, revelando o seu antigo e fervoroso apoio à regionalização, (posição contrária à actual) que chegou a incluir tournées pelo país, primeiro artigo publicado na imprensa em defesa da regionalização, etc. Passei a conhecer a história (para mim nova, dado que na altura estava mais preocupado em concluir o 9º ano de escolaridade obrigatória) do “Cavaco 1 regionalista” (sic) (Lei-Quadro da Regionalização no seu 1º governo), a do “Cavaco 2” anti-regionalista…curioso ainda registar que a Assembleia Constituinte era toda ela regionalista por uma razão ou por outra. Enfim, uma intervenção recheada de tiradas humorísticas, pequenas facadas (e elogios) no governo de José Sócrates que não conseguiu evitar alguns sorrisos amarelos por parte de António Costa, sempre revelador de um saudável desportivismo.
Quanto a Paulo Rangel, realce para a clareza do seu raciocínio abstracto (coisa rara hoje em dia) e para a firmeza das suas convicções. A sua intervenção foi mais ou menos neste sentido: em tese, um sistema de governo centralizado pode contribuir para um desenvolvimento justo e equilibrado de todo o país. Em rigor, a coesão nacional não depende de um modelo administrativo, mas sim da forma como é exercido o poder. O que se tem observado nos últimos 30 anos é a existência de governos centrais que não favoreceram em nada esta mesma coesão, razão pela qual Paulo Rangel defende a criação de algum tipo de instituições intermédia (CCDRs ou outras), o que deveria idealmente implicar a assumpção de algumas competências adicionais por parte dos municípios (educação, saúde, etc) e a perda de outras (urbanismo…). Só gostaria de fazer uma observação em relação ao raciocínio de Paulo Rangel: penso que não necessitamos de observar a experiência dos últimos 30 anos…já sei que a política (politics) é em grande medida uma ciência prática. Mas se porventura a experiência tivesse sido positiva isso seria um argumento contra a regionalização/descentralização? Creio que não. Creio que se trata de criar condições mais favoráveis para que se dê o tal desenvolvimento coeso e justo da nação. Seria o mesmo que defender a propriedade do estado de alguns bens de produção porque durante um certo período de tempo se teria observado um bom aproveitamento dos recursos. Sabemos que isso não é impossível de acontecer, mas é muito maior a probabilidade quando esses meios de produção são detidos por particulares. Ou seja, o que estou a defender aqui é que não se deve defender uma posição acerca de algum assunto tendo em conta apenas a prática observada, mas sim principalmente com base em raciocínios abstractos e lógicos (tipo premissas, conclusão…). Até porque é sempre possível para posições opostas em relação à maior parte dos assuntos, recorrer a exemplos que justifiquem uma ou outra posição…
Enfim, já me alonguei demasiado, fugi ao tema...mas voltarei ao tema do modo como se faz a defesa de opiniões com recurso a casos concretos, algo que está muito na moda e que considero tratar-se de um exercício de demagogia (vide caso "Joe the Plumber”). Mas sim, valeu bem a pena assistir à conferência. A próxima é já no dia 5 de Março com a presença de Artur Santos Silva, Proença de Carvalho e Rui Vilar a defenderem o Não à Regionalização! Será que sairão vivos do Auditório da Biblioteca Almeida Garret? :-)

Sem comentários:

Enviar um comentário